Tuesday, May 14, 2013

Os rostos da República: Fernando Pessoa (04)


Já aqui escrevemos que a vida de Fernando Pessoa foi uma constante divulgação da língua portuguesa: nas próprias palavras do heterónimo Bernardo Soares, "a minha pátria (sic) é a língua portuguesa". 

Em qualquer génio, há sempre um elemento de diferença, um grau de superioridade que não se explica, apenas se constata, mas a sua genialidade não nasce do nada.

O génio em formação beneficia de certas condições familiares ou ambientais ou é estimulado por acasos da vida que podem ser uma coisa simples, vista ou ouvida e logo esquecida que, numa criança, pode mudar todo o curso futuro da sua inteligência.

Em Fernando Pessoa não é difícil perceber porque floresceu tão cedo nem porque se manifestou no domínio das letras.

Ele é o primeiro filho de um casal muito culto e informado sobre a actividade “menos útil mas mais sublime da inteligência humana: a criação artística”. 

O pai era um apaixonado grande pela música e Richard Wagner era um  dos compositors preferidos, sobre quem escrevia crónicas nos jornais. Sabemos que Pessoa mesmo quando se esquivava, nos últimos anos, dos factos mundanos, continuava a gostar de ir a concertos de música clássica.

A Mãe, Madalena, era amante dos livros que lia em português e em francês e também fazia versos.

Havia também uma tia da mãe que fazia versos e que ele definiu como “mulher culta”, céptica em religião, aristocrática e monárquica e não admitindo no povo o cepticismo”.

Estes factos explicam que foi fácil a Fernando Pessoa aprender a ler e a escrever aos quatro anos de idade. A mãe ensinava-lhe também o francês pelo que o nosso escritor foi uma criança privilegiada.

A infância de Fernando Pessoa foi marcada or acontecimento inesquecíveis para o pequeno Fernando. O pai morre em 1893, quando ele tem cinco anos. A sua casa cheia de gente, de repente fica quase vazia, com uma avó Dionísia demente, e a família empobrece materialmente sendo obrigada a abandonar o casarão do Largo de S. Carlos.

Muda-se, com a família, para nova casa mais pequena e um ano depois perde um irmão que reagiu mal a uma vacina contra a tuberculose.
Toda a vida do poeta foi perseguida pelo medo de herdar uma das duas doenças que tanto ensombram a sua infância: a loucura da avó Dionísia e a tuberculose do pai.

Nunca manifestou sintomas do primeiro dos males e as afirmações de loucura em Álvaro de Campos eram aitudes literárias sem peso maior, e a alegada intenção de se internar num manicómio, numa carta à namorada Ofélia, foi um pretexto artifical para não se comprometer com ela.

No entanto, o receio da loucura é real na vida de Fernando Pessoa, sobretudo após o seu regresso a Lisboa, em 1905.

Com maior razção, receava ser vítima da tuverculose, dada a fragilidade do seu corpo, adoecimentos com frequência e embora não fosse hereditária, a tuberculose parecia ser uma ameaça na sua família. Vitimara o pai, o irmão e o tio.

Entretanto, a mãe de Pessoa conhece um oficial da Marinha, iniciando uma relação a que os familiares franziram o olho, um vez que Madalena tinha enterrado o marido há menos de um ano.
A vida em comum obrigava o casal a mudar-se para África. Que fazer com o filho Fernando? Temiam-se as febres tropicais. Ficava em Lisboa com a tia Maria ou era mandado para a Tia Anica, nos Açores? 
 
A este dilema, Fernando Pessoa responde com um poema à mãe: 

Eis-me aqui em Portugal 
Nas terras onde eu nasci. 
Por muito que goste delas, 
Ainda gosto mais de ti”.

É talvez o primeiro poema de Fernando Pessoa, escrito em 26 de Julho de 1896.

A mãe acabou por levar Fernando para Durban, na África do Sul, em Janeiro de 1896. O poeta tem oito anos de idade. São estes sete anos e pouco de vida que impedem Fernando Pessoa de ser um poeta inglês, devido à sua grande ligação afectiva a Portugal.

Ao longo da vida, Fernando Pessoa, dentro ou fora de Portugal, manteve sempre uma firme lealdade ao país onde nasceu e as muitas saudades exprimidas na sua poesia evocam a infância, não na África do Sul, mas em Lisboa, que para ele "era o lar, o regaço, o âmago da sua pátria amada”.

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