Saturday, May 12, 2012

Os rostos da República de A a Z: Bernardino Machado (07)


Veio o 28 de Maio e Bernardino chama ao Governo o general Cabeçadas, renunciando e transferindo para eles as funções presidenciais.

Bernardino não quis pactuar com a ditadura nem com ditadores. Quis ele próprio ir-se embora, sem ser escorraçado. Quem o pode condenar, depois das acusações dos democráticos, em 1917?

Em Lisboa, na sua casa, assistiu à queda sucessiva de Cabeçadas e de Gomes da Costa e ao assalto do poder pelos grupos anti-republicanos dos Carmonas e dos Sineis de Cordes e retoma o combate, com os resistentes à Ditadura, com “A política e o poder militar”, primeiro de uma longa série de opúsculos que iniciava a conspiração até ser forçado a abandonar o país em 1927.

Dez anos depois, a situação repetia-se e Bernardino machado partia para Vigo num país que não era o lugar indicado para um ex-presidente democrático.

Em Julho, busca asilo em França, onde reside até 1932.
Aos 76 anos, aquele homem era considerado um perigo para a segurança dos ditadores, iniciando o período mais amargo e duro da sua vida.

As sucessivas amnistias – para branquear o regime ditatorial – excluíam-no sempre, para o forçar a calar-se, a abandonar o combate, a domá-lo servindo-se da sua idade mas não o conseguiram.

Ele e Afonso Costa representam até 1932 a difícil unidade da Oposição à Ditadura, através de panfletos virulentos e certeiros. Dirigiu-se várias vezes aos chefes de Estado, à Sociedade das Nações protestando contra o reconhecimento da Ditadura.

O ódio dos ditadores era tanto que chegaram a prender-lhe os filhos e outros familiares e aplicando-lhes multas exorbitantes de 200 contos.

Estabilizada a República em Espanha, Bernardino aproxima-se da Pátria e fixa-se em L a Guardiã, frente a Caminha, a dois passos do seu rio Minho, de onde se vê Portugal.

O ancião de 80 anos, esperando a morte a todo o momento, sentia-se mais perto da Pátria que nunca quis abandonar, na esperança de visitar clandestinamente familiares, amigos e pisar a sua terra de infância.

Bernardino Machado não afrouxou o seu combate e valeram nesta altura as influências de Afonso Costa junto dos irmãos mações espanhóis para evitar o internamento forçado de Bernardino... que foi obrigado a sair da fronteira e fixar-se na Corunha, em 1935, e Madrid, onde eclode a Guerra civil.

Novo elã anima Bernardino com a resistência republicana e democrática espanhola, antevendo o contágio a Portugal. Mas era necessário sair de Madrid, cidade cerca pelas hostes franquistas, pelo que aos 85 anos se vê forçado a abandonar a casa  e viajar para Valência e daí para França, em Outubro, a conselho de Afonso Costa. 

O seu combate prossegue mas de modo mais frouxo, com a morte de Afonso Costa, em Maio de 1937, um duro golpe para o ancião.

Com o eclodir da II Guerra Mundial redige um manifesto e Salazar responde com a amnistia que o inclui em Maio de 1940.
Paris caía em Junho, convencendo Bernardino a viajar para Portugal, numa epopeia que Jaime Cortesão narra de forma inesquecível. 

É a hora da grande angústia com a queda de França, numa fuga de comboio em terceira classe, apinhada, incómoda, que traz um ancião que encarnava um século de história e voltava à Pátria após treze anos de exílio.

Era o momento da traição que a Pátria lhe preparara: ao chegar à fronteira de Vilar Formoso, é detido e levado para uns infectos cárceres em Lisboa. 

Depois de um violento telegrama enviado a Salazar, este desterra-o para uma residência a norte do rio Douro.

A 29 de Junho parte para Paredes de Coura, onde tinha casa e bens e é entre o Porto e Coura que viver os últimos quatro anos de vida, vivendo a dor de perder a companhia da mulher, momentos antes da alegria da entrada dos Estados Unidos e da União Soviética na II Guerra Mundial e das primeiras grandes vitórias dos aliados.

Em Meados de Abril de 1944 é internado num Hospital do Porto, vindo a falecer no penúltimo dia desse mês, rejeitando qualquer homenagem dos ditadores portugueses.

Era a grande e profunda lição da sua vida: o combate à opressão sem tréguas, em todas as suas formas, a luta permanente pela liberdade e pela democracia, assente na lei da solidariedade humana, na prática da justiça e na dedicação com a Pátria. Mesmo na morte, “não faltou ao Juramento que fizera como Presidente da República portuguesa” – escreve Oliveira Marques.

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