Wednesday, February 2, 2011

Cem anos de República no Minho (fim)


A última crónica sobre o centenário da República não pode terminar com uma descoberta resultante das leituras em que tropeçámos ao longo destas semanas: o jornal Correio do Minho tem mais de cem anos.

Esta certeza desmonta todas as escritas feitas até hoje, incluindo por nós próprios. No dia 6 de Julho de 1926 aparece um diário em Braga com o nome do jornal que “anos antes surgira vinculado ao Partido Progressista e que agora renasce noutro contexto” — escreve Amadeu José Campos Sousa in “Braga no entardecer da Monarquia ao tempo da 1.ª República (1890-1926), Casa do Professor, Braga, 2004, p. 208.

O esse jornal é “Correio do Minho”, cuja data de fundação tem vindo a ser celebrada é 6 de Julho de 1926.

A partir desta nota de rodapé — sem a sagacidade técnica de um historiador que não somos — verifica-mos que o nome “Correio de Braga” surgiu em 1890 e terá sido um jornal que durou pouco tempo.

O nome “Correio do Minho” aparece associado ao Partido Progressista que dominava o círculo eleitoral de Braga desde 1897 e é perfeitamente natural que tivesse um meio de comunicação social que divulgasse as suas propostas políticas e as figuras proeminentes.

Um meio
do Partido
Progressista


A última década do século XIX é dominada em Braga pelo Partido Progressista (cf. Commercio do Minho,n.º 3401, de 10/12/1895) que retoma o poder em Braga nos anos 1898 a 1905, coincidindo com o poder em Lisboa.

Sabe-se que quem liderava o Partido Progressista eram proprietários, comerciantes, industriais, financeiros ou profissões liberais que dominavam a Associação Comercial, o Banco do Minho, o Ateneu Comercial, a Companhia de Seguros Fraternidade, e alguns padres, sob a liderança do Conde de Carcavelos (cf. Amadeu Sousa, in op. cit. p. 81-83) em substituição do Visconde da Torre (que se mudara para os Regeneradores).

Há referências ao jornal Correio do Minho, ligado ao Partido Progressista nos anos 1902 até 1907, no auge do domínio daquele partido em Braga. Este partido sofre uma cisão em 1897 e cria o seu jornal “O Progressista”.

A divisão deve ter acelerado a morte deste jornal e do “Correio do Minho” porque, em 1910, Braga possuía seis semanários, um bissemanário e um trissemanário, mas já não existe nem “O Progressista” nem o “Correio do Minho” (cf. Zara Coelho, in A Implantação da República na Imprensa de Braga, Lisboa, 1990, p. 100-120).


Sabe-se que o jornal “Correio do Minho” existiu — como bissemanário? — entre 1902 e 1907, ano em que se extinguiu — ao serviço do Partido Progressista e o seu nome (fresco na memória de Álvaro Pipa, militante daquele Partido) é repescado em 1926 por este farmacêutico da Rua do Souto.

O Chefe de Redacção do jornal Diário do Minho era assumidamente antifascista. Com a revolução de 28 de Maio de 1926, os administradores do Diário do Minho — a empresa Minho Gráfico — demitem-no a 3 de Julho.

O Director Álvaro Pipa, durante dois anos, já se tinha demitido no dia 2 de Junho: “saio pela porta. Pela janela não, porque não sou nem nunca fui acrobata".

No dia 3 de Julho de 1926, Constantino Ribeiro Coelho (chefe de redacção) proclama solidariedade com o Director e é acompanhado por três jornalistas (Bento Miguel Costa, Theotónio Gonçalves e Joaquim d’Oliveira Costa (cf. Amadeu José Campos de Sousa, op. cit. p. 208).

Três dias depois ressuscitava o jornal Correio do Minho...

Cem anos de República no Minho (23)

De Braga, a crise alastra-se ao interior do Minho e com ela a impopularidade dos governos, a uma média de escassos meses de duração cada um, enquanto o povo passava fome e era castigado com novos impostos e alta de preços.

Veja-se só que Viana do Castelo vendia um cento de sardinhas a 120 reis e eram compradas em Braga a 1200 reis. Os intermediários engordavam com esta crise e havia comerciantes de Braga que retinham o peixe recebido de Viana num armazém junto à estação dos Caminhos de Ferro para depois o venderem a preço de ouro.

Abastecimento bloqueado

Mas pior estava para vir, com a greve dos lavradores, caseiros e jornaleiros (da lavoura) ao abastecimento da cidade de Braga porque a Câmara inventou um imposto sobre os produtos da terra entrados nas “barreiras” da cidade. Eram as portagens de há cem anos!

As lutas dos operários sobem de tome e adquirem novas formas: num ápice, surgem notícias de atentados bombistas – “enorme estampido de duas bombas de dinamite que a malvadez arremessou contra dois estabelecimentos da indústria metalúrgica onde os operários se encontram, em greve”. Dois patrões atribuem os atentados ao sindicato. Estava aberto o caminho para o precipício mortal da I República, três anos depois, e nem as visitas dos heróis Gago Coutinho e Sacadura Cabral — no dia 7 de Dezembro de 1922 — serenaram a vontade de mudança.

Foi um dia grande para Braga, conforme relatam os jornais da época, com o povo entusiasmado diante dos dois gigantes que “nesta hora de descrença tanto solavancaram a alma nacional”.

Em Braga correram as lágrimas, rezou-se pela Pátria e os minhotos vindos de todos os lados, mostraram “descender dos velhos portugueses de 1500, atirando-se de alma e coração para um uníssono supremo de hossanas, homenageando os heróis”. O Diário do Minho descreve que “não havia um palmo de chão, da Arcada ao Caminho de Ferro. (...) Cinquenta mil criaturas, cem mil pessoas? Sabemos lá!... O que sabemos é que jamais se viu tanta gente reunida na velha cidade do Minho.

O entusiasmo foi de tal grandeza que Sacadura Cabral volta a Braga no ano seguinte, mas a instabilidade e a fome alimentavam — por cá e em Espanha — a descrença da esperança numa ditadura como mal menor.