Thursday, August 6, 2009

Franceses em Braga há 200 anos (17)


Todas as guerras têm os seus heróis e vítimas. Depois de darmos a conhecer o grande General Silveira e Bernardim Freire de Andrade, é justo lembrarmos hoje outro português que morreu às mãos dos bracarenses.

A barbárie, porém, não era um exclusivo gaulês. A populaça em fúria, antes da Batalha de Braga, que aniquilou três dos nossos compatriotas, instigados no boato prontamente desfeito de que eram trai-dores. A primeira vítima da turba seria o comandante em chefe das forças do Minho, General Bernardim Freire de Andrade que foi linchado na véspera do dia 18, onde hoje é a Praça da República (à Arcada).

Seguiu-se o engenheiro militar Custódio Vilas Boas, iminente cartógrafo e autor do quimérico projecto de navegabilidade do Cávado até ao Vau do Bico, que foi arrastado do Mosteiro de Tibães até à cidade onde foi executado.

Portanto, a Câmara de Braga ao atribuir o nome de Custódio Vilas Boas, junto à Central de Camionagem, dando acesso à av. Norton de Matos, a uma artéria, homenageou um minhoto distinto que contri-buiu para o engrandecimento e economia, não só do Minho, mas também da cidade de Braga.

Por fim, quando a multidão se preparava para abandonar a cidade, ainda teve tempo de eliminar o corregedor dr. Bernardo José Passos, no local onde hoje é a rua dos Capelistas.

No planalto da Serra do Carvalho, comandava a defesa do norte do País, o General Bernardim Freire de Andrade que tinha como seu Quartel Mestre, o capitão Custódio José Gomes de Vilas Boas, mais tarde, segundo o seu assento de óbito, tenente-coronel.

Com tão escassos meios a opor ao invasor, dotado de escolhidos e experimentados soldados, com poder de ofensiva ainda bastante forte, apesar de toda a vontade de repelir as tropas francesas, oferecendo alguma resistência, traduzido pelo desnivelado combate, o General Freire de Andrade, face à desvantagem das forças que comandava, retirou para Braga, onde poderia melhor estabelecer a defesa da cidade.

Esta estratégica retirada, não foi bem vista pelo povo, que amotinado julgou Freire de Andrade, como jacobino e francesismo, pois tinha o labéu de ter tomado parte na famosa Legião Portuguesa, incorporada à força no exército francês, aquando da Primeira Invasão comandada por Junot.

O seu Quartel Mestre, Custódio José Gomes de Vilas Boas, apanhou por tabela essa desonra. A fúria do povo, descarregou sobre essas duas notáveis figuras de portugueses, a sua raiva. Um e outro pagaram, com a vida, o seu patriótico exemplo. Primeiro, em 17 de Março, é assassinado Bernardim Freire. Luís Costa, num dos seus muitos artigos publicados no Correio do Minho, socorre-se do livro de óbitos de São Lázaro : “Aos dezassete dias do mês de Março de mil oitocentos e nove faleceo com todos os sac. digo faleceo porque o matarão em o Campo de Santa Ana com tiros o General em chefe Bernardim Freire seo corpo foi posto em hum Caixão e sepultado em esta Parochia de São José e athé ao Prezente nada teve de sufrágio”.

REFÚGIO
EM TIBÃES

Em consequência do avanço das tropas napoleónicas, avanço que, na região atribuíam a traição dos chefes militares portugueses, temendo pela sua segurança, Vilas Boas, refugia-se no Convento de Tibães, tendo ali sido procurado pela enraivecida, turbulenta e desorientada turba.

Trazido para Braga, é assassinado, também a tiro, no Campo de Santa Ana, no dia seguinte ao da morte de Freire de Andrade, 18 do mês de Março de 1809. Por seu lado, Bernardino Amândio, na obra “O Engenheiro Custódio José Gomes de Vilas Boas”, afirma que, “apesar de ter desaparecido com Vilas Boas, o notável Engenheiro Militar e hidráulico, a figura culta e profunda que se surpreende nas obras e escritos que nos legou o Livro de Óbitos de São Lázaro apenas se limita a acrescentar a causa da sua morte, em “o dia de guerra” e o local da sua sepultura ‘na paróquia de S. José, sem nada ter por sua Alma ’.

Arnaldo Gama, na obra “O Sargento Mor de Vilar” sustenta que “Custódio José Gomes de Vilas Boas, Quartel Mestre General, era oficial de engenharia, homem inteligente e de muito saber, Foi o primeiro engenheiro a quem se incumbiu a canalização do Cávado, assunto sobre que deixou escritas algumas memórias …Gozava de toda a confiança e amizade de Bernardim Freire, a quem tinha auxiliado valiosamente com o seu saber e com a sua energia na organização da defesa do rio Minho. Desde longa data que os comerciantes, marítimos, agricultores e industriais do vale do Cávado (Baixo Minho e até Trás-os-Montes) vinham reclamando junto dos poderes públicos o aproveitamento da foz do rio, em Esposende, para se formar ali um porto de mar, ao mesmo tempo que achavam que seria de toda a conveniência, para desenvolvimento e escoamento dos produtos daquelas regiões que fosse encanado o rio. No ano de 1795, a Rainha Dona Maria I, “compreendeu o alarme da gente de Esposende e deve-se o pri-meiro estudo sério e talvez único até aos nossos dias. Por Alvará de 20 de Fevereiro de 1795, aprovou o plano de obras de canalização e navegação do rio Cávado, desde a sua foz até ao Vau do Bico, na confluência dos rios Cávado e Homem”.

No entanto só no dealbar do século XIX, é que o antigo desejo dos povos do Baixo Minho principiou a tomar verdadeiras providências para se vir a concretizar tão audacioso projecto, com a entrega da direcção, projecto e demais necessárias acções, ao Capitão de Engenharia, Custódio Vilas Boas. Do projecto fazia parte a construção do porto para entrar na barra de Esposende e na Enseada dos Cavalos de Fão.

Vilas Boas chegou a dar início as obras, mas o estado de guerra em que o País se viu envolvido, fez com que elas fossem interrompidas e jamais voltando a ser retomadas. Para isso contribuiu o desaparecimento inglório do Engenheiro Director.

1 comment:

Luís Moreira said...

Parabéns por não ter deixado no esquecimento um dos muitos heróis desconhecidos da nossa História. As minhas investigações académica permitiram-me conhecer a vida e obra (especialmente a cartografia) deste engenheiro militar. Deixo apenas um reparo: o atlas Flamsteed que aparece na imagem é uma tradução de Custódio Gomes de Villasboas, tio de Custódio José, com quem é confundido muitas vezes.