Saturday, April 11, 2009

Política nebulosa: inocente condenado




Leio e não posso crer que o líder de um partido que é alternativa ao poder em Braga tenha dito que Domingos Névoa "não deixa de ser alguém que foi condenado pelo crime de corrupção" e parta daqui para uma série de considerações de carácter político-partidário.

Depois da primeira surpresa, não me custa a ler que o PCP de Braga — através da sua comissão política concelhia — venha lamentar a nomeação de Domingos Névoa "condenado recentemente por corrupção" e denunciar a promiscuidade existente no Bloco Central (PS e PSD).

Já não me espanta a ligeireza — mais condenável porque é parte no processo em curso — com que o Bloco de Esquerda lança uma petição enganando os subscritores quando pede aos líderes do PS, PSD e CDs que destituam Domingos Névoa e se pronunciem sobre a atitude dos seus autarcas que "votaram num condenado por corrupção".

Por sua vez, o Bloco de Esquerda de Braga afirma que é a " primeira vez que um condenado por corrupção activa afronta a justiça e a democracia" classificando a sua eleição para a presidência da Braval como "uma total falta de vergonha" (cf. Diário do Minho, 02.04.2009, pp. 6-7).

O PSD e o PCP como partidos responsáveis e estruturantes da democracia portuguesa não podem invocar ignorância sobre a lei Fundamental do nosso país, a Constituição, a qual determina que "todo o cidadão se presume inocente enquanto não houver trânsito em julgado da respectiva sentença de condenação".

O BE, por maioria de razão, por ser parte no processo em que foi primeiro a apresentar recurso da sentença em primeira instância, o que desde logo, inviabiliza — à sombra da nossa Constituição — que ele possa ser condenado a ser condenado.

E se assim é, então, das duas uma,
1. ou esse princípio constitucional é aceite e reconhecido como valor fundamental dum Estado que se pretende, verdadeiramente, de Direito, sempre e não apenas quando nos agrada, ou,
2. ao invés, é um mero exercício de retórica, sem valor, em que o Estado deixa de proteger os direitos mais elementares dos cidadãos, ficar sujeitos ao capricho de quem detém o poder de aparecer nos jornais ou das «emoções populares».

Ora, enquanto simples cidadão, quanto mais como jornalista, repugna-me aceitar que este princípio seja violado por quem já não tem os mínimos escrúpulos no exercício da actividade política, em que vale tudo para atingir os seus objectivos.

Porquê, então, ainda na dúvida (dado não haver condenação, muito menos com trânsito em julgado), condenar alguém, exigindo-lhe a demissão das funções por si exercidas, num retrocesso civilizacional?

Decididamente, em Braga, torna-se cada vez mais difícil, preocupantemente, a desejável e democrática discussão de ideias, projectos e valores porque gente muito responsável prefere abandonar a sala, serena e isenta dos Tribunais para o «Pelourinho» da praça pública emocionada.

Todas as justificações deste mundo e do outro nunca podem justificar — não justificam — nunca que se lance aos cães a honra de um homem e, por fim, a sua vida à custa de uma dupla violação criminosa dos seus acusadores em relação às leis fundamentais da nossa República, as que protegem a dignidade e a liberdade de cada um de nós.

Tal como o jornalista cúmplice, um político, seja ele qual for, não está acima da sociedade, mas faz parte dela. A necessidade de apanhar votos — mesmo à custa da ignorância dos simples — ou de vender jornais não pode nem deve ofender a honra, violar a imagem e ofender a dignidade de ninguém. Isso também é crime.

Os políticos de Braga têm de aprender de uma vez por todas que não podem recorrer à Justiça para fazer número ou "show off" e depois agir como se Portugal não fosse um Estado de Direito, com uma Constituição que preserva direitos fundamentais, entre eles, o do bom nome e o da presunção da inocência.

Chegámos ao grau zero (underground) da actividade política: à falta de temas, ideais e projectos, descamba-se para a fulanização da política, desrespeitando totalmente os direitos das pessoas.

Por um minuto, ponham-se no lugar dos enxovalhados. Que faziam? Toleravam? Não. Apresentavam queixa crime, como já o fizeram... todos. E fizeram por menos.

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